Entre 2002 e 2005, Jason Nelson,
um famoso game designer que trabalhou com a Wizards
of the Coast e com a Paizo em
jogos como D&D e Pathfinder,
escreveu uma coluna chamada Behind the
Screen, publicada gratuitamente na página da empresa, que traduzimos como Atrás da Divisória do Mestre e trazemos
aqui nos Meus Pergaminhos para
vocês. Esperamos que gostem!
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Divisória do Mestre - Redbox |
ATRÁS DA DIVISÓRIA DO MESTRE – NOVATOS
NA VIZINHANÇA
Texto original de Jason Nelson
publicado no site da Wizards of the Coast em 29/11/2002.
Em todos os hobbies, passatempos
e áreas de interesse, você tem pessoas que conhecem os seus meandros em
diferentes graus. Os hobbies, no entanto, não são atividades puramente
insulares - se fossem, eles morreriam junto com seus fãs, pois o conhecimento
nunca seria repassado. Pense em quão diferente seria a mesa de jogo se ninguém
transmitisse citações de TV e filmes em todas as sessões! Logo, ninguém se
lembraria que os filmes e programas Hawk
the Slayer ou The Sword and the
Sorcerer ou Wizards & Warriors
já existiram... bem, talvez isso seja
uma coisa boa, mas você entendeu! O ponto é que um hobby deve se propagar para
sobreviver, crescer e prosperar, e para isso deve ser aberto a novos
"membros do clube".
Os jogadores gostam de seu hobby,
e quem gosta dele deve se sentir orgulhoso o suficiente para espalhar a
notícia. Um certo subconjunto da população ainda terá calafrios (ou tentará dar
eles a você) se você falar sobre o jogo, mas se você sabe que essa linha de
raciocínio é uma piada, então não há nada para se envergonhar quando você lê
seu último suplemento ou módulo em público. Olha, um número razoável de
jogadores já está classificado como nerds, CDFs, geeks ou esquisitos (inclusive
eu), então não é como se alguém, ao saber que você joga RPG, rebaixasse
mentalmente a sua reputação. Via de regra é possível que a sua reputação já exista!
Você provavelmente não deve usar sua camiseta "Escravo de Demogorgon"
com roupas formais, mas quando você fala ou lê, conversa na internet, participa
de grupos ou segue perfis nas redes sociais ou faz qualquer outra coisa relacionada
ao RPG, já está realmente "anunciando" o hobby. D&D e outros RPGs não são exatamente o jogo da moda ou notícias
de primeira página (ainda que tenham parecido bem na mídia, como na série Stranger Things), então jogadores em potencial por aí podem nunca ter ouvido falar sobre
o hobby se você não contar a eles sobre sua existência. Este texto
dificilmente pode ser chamado de uma campanha de recrutamento de novos
jogadores, mas se você acha importante o crescimento do hobby, poderá sentir um
pouquinho de responsabilidade de fazer parte desse esforço.
Se você encontrar uma alma
interessada, convide-a para o seu jogo ou encaminhe a pessoa para outro mesa
que possa atender melhor às suas necessidades. Talvez essa pessoa viva do outro
lado da sua cidade. Ele ou ela pode entrar no seu jogo, mas pode ser uma longa
viagem. Se você conhece um lugar (como uma loja de quadrinhos ou boardgames)
que hospeda jogos ou um grupo que se reúne por lá, coloque a pessoa em contato
com essas pessoas. Vários grupos de jogadores na Internet podem ajudar os
amadores a se encontrarem. Entretanto, os contatos pessoais são melhores, e um
aperto de mão quente e um sorriso têm mais probabilidade de despertar interesse
em um novato do que um grupo ou um número de telefone (mas vídeos de stream com
jogos como o Critical Role [ em inglês], o Game Chinchila ou o canal do Thiago Lefundes Rocha [estes dois últimos em português] podem ser um bom convite a quem gosta de assistir jogos pela internet).
Quando um novo jogador aparecer,
ajude a pessoa a se familiarizar. Você não encontrará um processo instantâneo
ou uma fórmula pronta. Obviamente, você não pode simplesmente aparecer e ser
amigo instantâneo de várias pessoas que você nunca conheceu (mas que já se
conhecem). Você e seus companheiros que jogam certamente podem fazer um esforço
para garantir que a nova pessoa se sinta incluída. Você achará isso
especialmente importante se o novo jogador for diferente de alguma forma do
resto do grupo - talvez ele seja adolescente em um grupo de jogadores de trinta
e poucos anos, ela seja uma mulher em um grupo cheio de homens, cristão ou
judeu ou Muçulmanos em um grupo de ateus / agnósticos, um afro-americano em um
grupo cheio de caucasianos, e assim por diante. É bem possível que isso não
diferencie de qualquer outra situação quando alguém novo entra no grupo,
independentemente de quão semelhantes ou diferentes eles sejam às pessoas que
já estão no grupo. Às vezes, pode ser estranho e artificial, afinal, leva-se
algum tempo para aprender as reações e os padrões de interação um do outro. O
importante é simplesmente ser atencioso - não fale além da pessoa como se ela
não estivesse lá ou interrompa-a quando estiver falando. Evite piadas constantes e referências obscuras que possam fazer com que
o novo jogador se sinta deixado de fora. Sejam respeitosos. E mais
importante ainda, perceba que você não está lidando apenas com uma nova pessoa
em um grupo de pessoas, mas é um jogador novato no meio de jogadores
experientes – basicamente duas coisas para se preocupar.
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Cavaleiros da Mesa de Jantar (Texto Alterado) |
Deixando de lado a dinâmica
interpessoal (e desde que esse ponto foi abordado nas colunas anteriores), é
necessária uma mão cuidadosa para iniciar um novo jogador nas regras do jogo.
Parte de fazer uma pessoa se sentir bem-vinda é garantir que você ou outras
pessoas não a façam se sentir como um idiota ou uma âncora atrasando o grupo.
Mesmo que a nova pessoa faça algo que os jogadores experientes acham bobo,
idiota ou contra a lógica do jogo, você precisa ter alguma cortesia e
sensibilidade para explicar a mecânica das regras e os prováveis resultados das
decisões que o jogador poderia tomar. A edição atual do D&D é muito mais intuitiva do que as anteriores e, portanto,
menos confusa a esse respeito, mas você ainda tem uma ampla gama de opções do
que fazer, o que pode ser uma variedade desconcertante de opções. Até jogadores
experientes podem ter dificuldade em acompanhar e certamente tantas opções podem
sobrecarregar novos jogadores. Uma mão amiga do Mestre ou de outros jogadores
pode ser de grande ajuda.
“Dar uma mão” é potencialmente perigoso, no entanto, porque você ou
seus outros jogadores podem achar mais fácil começar “guiar” esse jogador e
personagem pela suposta "mão amiga", a ponto de o novo jogador sentir
que os outros é que estão jogando com seu personagem. Quando o ponto
essencial do jogo é imaginar um personagem fantástico e imaginar as aventuras
que você deseja que ele ou ela viva, o que poderia ser mais enlouquecedor do
que descobrir que você sente que não tem controle sobre o que ele ou ela faz?
Se aqueles que estão ao seu redor constantemente lhe dizem o que fazer, por
mais solícitos que possam ser em seus corações, você pode se sentir muito mais
como um poodle amarrado do que como um aspirante a herói. Como uma criança com
um projeto de feira de ciências, o novo jogador ficaria feliz em ter sua ajuda,
mas provavelmente não quer que você simplesmente decida tudo por ele. Você pode
se sair melhor que a pessoa, assim como a criança teria uma nota melhor se o
adulto fizesse sua lição, mas toda a experiência se torna vazia, sem poder, sem
recompensa e insatisfatória, e provavelmente o jogador não a repetirá se tiver
a opção. Existe uma linha muito fina entre dicas úteis e checagem
condescendente ou mesmo dominadora, e você deve agir com cuidado ao ajudar um
novo jogador a colocar os seus pés no hobby.
Você deve saber que nem todos os
jogadores (ou, indiretamente, seus personagens) têm interesse no bem de novos
jogadores (e seus personagens) no coração. Jogadores não têm de forma geral (ou
não consideram ter) um interesse homogêneo na presença ou na participação do
novo jogador. Às vezes, alguns jogadores
se sentem tentados a tirar proveito de novos jogadores, de seu entendimento
incompleto das regras e, talvez, de sua inocência. Eles podem tentar enganá-los
da sua parte do tesouro ou fazer outros tipos de acordos desfavoráveis. Um
exemplo bem-humorado é do grupo de jogos "Black Hands" (apresentado de forma intermitente nos quadrinhos
dos Cavaleiros da Mesa de Jantar): um
"fundo de seguridade do personagem" no qual o novo personagem paga uma
quantia para financiar a sua possível futura ressurreição dos mortos. Com a
morte dele, no entanto, os PJs envolvidos na fraude simplesmente embolsam o
dinheiro. Obviamente, essa ideia é caricaturada por efeito humorístico, mas você,
como Mestre, deve ficar atento aos interesses do novo jogador e deve se sentir
à vontade para interferir quando algo muito escandaloso assim acontecer. Assim
como outros jogadores, você como o Mestre não pode segurar a mão do jogador
durante toda a campanha ou ditar suas ações, mas você deve pelo menos ficar
atento às coisas para garantir que ninguém esteja tentando enganar o novo
membro da mesa.
Uma última coisa sobre os novos
jogadores é que você não pode apenas convidá-los, jogar com eles e depois
deixá-los se afastar. Os jogadores experientes devem ter algum interesse em
novos jogadores e em seu ajuste no grupo, mas você, como Mestre, tem uma
responsabilidade de conversar com o novo jogador sobre sua experiência, para
avaliar o quão bem ele assimilou as regras do jogo e, ao mesmo tempo, se ele entrou
nos padrões sociais do grupo. Ajuda se você interrogar o novo membro tentando
descobrir do que ele gostou, o que não gostou, quais partes do jogo e a
situação foram confortáveis e quais pareceram difíceis. Pode ser que o novo
membro esteja apenas tentando o jogar por brincadeira e pode muito bem
acontecer dele ou dela não gostar. Agradeça à pessoa por ter vindo, informe-a
de que a porta está sempre aberta se ela quiser tentar novamente e dê adeus à
pessoa. Talvez a pessoa tenha problemas com a personalidade de um ou mais jogadores
ou talvez até com você (nem sempre o “santo bate”): o novo membro pode ter
gostado do jogo em si, mas talvez não da interação social com o grupo.
Novamente, às vezes as coisas simplesmente não dão certo. Ou talvez seja amor à
primeira vista. Nesse caso, esteja pronto para ajudá-lo a se tornar parte do
grupo e tornar-se um estudioso das regras do jogo para fazer com que as ideias
de fantasia heroica que habitam sua mente encontrem expressão no jogo.
Devo salientar que tudo isso
pressupõe um certo cenário - um grupo estabelecido de jogadores formado por
jogadores experientes que tentam incorporar um único novo jogador, novo para
eles e novo para o jogo. Existem muitas outras possibilidades, é claro, nas
quais a integração de uma nova pessoa poderia ocorrer:
1. Um novo Mestre dentro de um
grupo estabelecido de jogos (alguém que foi jogador, mas agora passando para
trás da divisória do mestre). O ex-mestre pode ter deixado o grupo, ter passado
a ser jogador ou estar mestrando uma campanha alternada com esta.
2. Um novo Mestre de fora do grupo
prepara o jogo. Isso é muito menos comum do que nos velhos tempos do D&D, quando um grupo de jogadores
mais jovens às vezes procurava um jogador mais velho para mestrar para eles,
mas que tem se tornado mais comum com a popularidade das mesas online.
3. Um novo jogador que esteja
familiarizado com as regras e o sistema usado no grupo (além de talvez um
punhado de regras da casa) se junta à mesa.
4. Um novo jogador que não jogou D&D (ou qualquer outro jogo neste
grupo), mas que tem experiência com jogos em outros sistemas, se junta ao
grupo.
5. Um grupo totalmente novo se
forma (sejam todos os jogadores experientes, todos os jogadores novatos ou uma
mistura de ambos os tipos de jogadores).
Pode ser que o seu grupo de
jogadores permaneça muito estável por anos e você nunca precise realmente lidar
com esse “problema”. Algumas pessoas são perfeitamente felizes em suas casas
com um pequeno grupo de velhos amigos, onde o jogo é realmente uma desculpa
para se reunir e socializar, assim como é para tentar "fazer" algo
dentro do jogo, como completando um checklist.
Para a maioria dos jogadores, no entanto, as campanhas geralmente duram menos
de um ano, e mudar horários de trabalho e escola ou situações da vida pode
fazer com que seu grupo de jogadores se modifique ao longo dos anos. Mais cedo
ou mais tarde, você pode se deparar com a perspectiva de ter de encontrar novas
pessoas para jogar, e como você lida com esses "novatos na vizinhança"
será muito menos sobre a ideia global de promover o hobby dos jogos e muito
mais sobre encontrar algum espaço e alguns amigos para o seu jogo.
PALAVRAS DE SABEDORIA
1. Espalhe a palavra: Diga alto e de forma orgulhosa: você é um
jogador! É como o slogan dos maçons: "Para ser um, pergunte a um". Os
futuros jogadores precisam saber que você é um deles antes que eles possam
perguntar sobre o hobby.
2. Faça com que se sintam bem-vindos: Você pode pensar que isso é
óbvio, mas os jogadores podem exagerar nas piadas, nas citações de regras
misteriosas e nos hábitos de conversação que podem dificultar a introdução do novo
jogador. Saiba a hora de se intrometer e entenda que pode ser uma longa jornada.
3. Ajude, mas não mate o jogo com sua bondade: Os novos jogadores
apreciam a ajuda de mestres e jogadores, mas no final eles querem decidir as
coisas por si mesmos e moldar o caráter e o estilo do personagem na visão
deles, não da sua (ou de seu grupo).
4. Não roube dos cegos: Não tire proveito da inexperiência de um novo
jogador. Isso parece óbvio, mas acontece, e não apenas nos quadrinhos. Eu nem
vou entrar no trote em novatos - se isso ainda existir (você nunca sabe, talvez
exista).
5. Continue falando: Converse com os novos jogadores sobre as
experiências deles. Descubra o que funcionou para eles e o que não funcionou.
Tente trabalhar com eles para ajudar com que cresçam em conhecimento e
habilidade no jogo.
FINALIZANDO
A TRADUÇÃO
Essa coluna traz pontos importantes sobre a introdução de novos jogadores. Ainda
são válidos as questões abordadas antes de uma nova mesa começar, e isso vale
para a introdução destes novos jogadores. Você pode ler sobre o começo de novas
mesas e sobre a Sessão Zero AQUI e AQUI.
FINALIZANDO O TEXTO
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