OU: O QUE DÁ ERRADO DEPOIS DO CHAMADO PARA A AVENTURA.
Texto de Carolina Caproni Nogueira
Às vezes acontece de, do nada, um tanto de pessoas virem me
fazer o mesmo tipo de pergunta num pequeno espaço de tempo, ou todo mundo nos
grupos de RPG começar a falar dum mesmo assunto, ou um mesmo caso se repetir
várias vezes em mesas diferentes. Lendas dizem que isso, frequentemente, faz um
texto meu aparecer.
Isso é, quando eu não tô com muita preguiça, o
que é tipo... 80% do meu tempo de vida? Bom, vamos em frente antes que a
preguiça me alcance.
Dessa vez não foi nenhuma pergunta, mas foi um
evento interessante: durante esse ano várias pessoas tentaram criar mesas de
RPG pela internet, reuniram jogadores, prepararam tudo... e então desistiram.
Quando fui checar elas, tipo "ei, como tá indo aquela mesa que você
montou?", tive respostas parecidas.
"Os jogadores não mostraram muito interesse, nem fizeram a ficha, então desisti da mesa."
Uff. Isso é um problema. Um baita problema, na
verdade. Uma das coisas que mais falta no nosso hobby é mestre, e quando
aparece alguém que quer mestrar, cria uma campanha e reúne um grupo, não vai
pra frente? Isso é basicamente morrer na praia. Isso precisa ser resolvido,
precisamos criar mais mestres, e não fazer os que já existem desistirem.
Normalmente meus textos têm um foco mais
específico, alguns são feitos mais voltados pra jogadores e a maioria é mais
voltada pra mestres, mas nesse aqui eu peço atenção dos dois lados. Acredito
que todo esse problema seja um mal entendido. Vou tentar ajustar isso,
analisando a situação. Se você só joga, não mestra e nunca vai querer mestrar,
pula lá pro subtítulo "para jogadores".
Esse problema é frequente?
Essa é uma parte importante da análise. De
início é normal pensar "poxa, sacanagem dos jogadores", mas vamos
lá... eu já mestrei pra muita gente e nunca tive esse problema, nem uma única
vez. Já aconteceu, sim, de entrarem na minha mesa, não gostarem do jogo e
saírem, mas isso de combinarem tudo pra começar a jogar e desistirem antes da
primeira sessão? Nem uma vez.
Admito que me senti tentada a pensar "mas
claro que isso não acontece comigo, eu sou uma mestre incrível e venerada,
especial, famosa e divina, as pessoas matariam pra ter um lugar na minha
mesa", mas acho que sou muito inteligente pra ser feliz assim. A verdade é
que, além de muita gente não gostar do meu modo de narrar, eu nunca tive esse
problema nem quando eu tinha 14 anos e não fazia a menor ideia do que eu tava
fazendo, e olha que eu mestrava 4e naquela época.
Esse problema também só começou a chegar mais à
minha linha de visão nesse ano, antes disso parecia raro. Então por mais que
ele pareça frequente agora, ele não foi sempre assim, e não é assim pra todo
mundo. Nesse caso...
Onde esse problema é frequente?
O que todas essas pessoas que me contaram esse
problema tinham em comum? Todas elas estavam tentando montar uma mesa de RPG
pela internet, com pessoas que elas não conheciam tão bem, ou pessoas que não
conheciam RPG de mesa ou o sistema que iam utilizar são bem.
A maioria dos mestres com esse problema era mais
velha que eu, que tenho 27 anos, e a maioria costumava jogar RPG de mesa
presencialmente.
Com esse padrão, eu pensei...
... os jogadores estão realmente desinteressados?
Ok, ok, eu sei... "mas Carolina, claro que
sim, eles nem criaram a ficha!", eu sei, ok? Mas presta atenção: se o
mestre fez um post sobre o jogo dele, as pessoas tiveram o trabalho de ir lá e
comentar, decidiram horários, mostraram interesse e só ficou faltando a ficha
pra começar o jogo, qual o sentido deles sumirem antes da primeira sessão?
Jogador de RPG é tudo doido?
Bom, na verdade sim... mas não nesse aspecto,
ok? No caso de jogar, eles querem jogar. Eles já demonstraram interesse quando
falaram que queriam entrar na mesa. Eles ESTÃO interessados.
"Se estivessem interessados de verdade,
teriam criado a ficha!"
É aqui que rola o mal entendido, meu caro.
"Desinteresse" não é o único motivo pra uma pessoa não te entregar a
ficha e o background dela. Qual o outro motivo? Um que você conhece bem:
insegurança.
Eu gosto de escrever textos pra muita gente ler,
assim eu posso chamar todo mundo de inseguro e não deixar ninguém ofendido.
Todo mundo vai ler isso e pensar "ela tá falando com os outros leitores, e
não comigo". Heh.
Voltando ao assunto, é aqui que as coisas
começam a fazer mais sentido: jogadores que ficavam desinteressados antes do
jogo começar? Nunca tive. Jogadores que não entregavam a ficha nem o background
rápido? Ah, meu amigo... E TEM ALGUM QUE ENTREGA?
"Sim," você pensa, "eu como
jogador entrego, meus jogadores antigos entregavam."
Primeiramente, você não é base pra entender
jogador se você é mestre. Você e eu sabemos que "ser mestre" muda
muito o modo de ver o jogo. Sobre seus jogadores antigos... provável que era
uma mesa presencial, que eles eram seus amigos, ou que eles conheciam o sistema.
Jogadores são pequenos animais selvagens e ariscos.
Você achou eles na selva da internet. Eles não
conhecem você, não sabem como você mestra, e mesmo que conheçam o sistema, não
sabem como ele vai ser usado na sua mão. O que eles podem por no background
deles, eles podem inventar nomes de cidades ou você não deixaria isso? Eles
podem por um personagem totalmente social ou você só dá ênfase em combate? Eles
podem fazer um personagem com os pontos distribuídos de modo mais orgânico na
ficha, ou só sobrevivem na sua mesa se for na base do min-maxing?
"Mas eles podem só me perguntar isso!"
Shhh, essa é sua mentalidade de mestre falando.
Jogadores que não mestram são animais selvagens, lembra? A chance deles irem
até você pra perguntar isso é a mesma chance de um mico-estrela que nunca te
viu decidir andar até seu piquenique despreocupadamente, pegar seu pão de
queijo e ir embora comendo ele: só aconteceu comigo uma vez.
"Ok, então o que você sugere que eu faça pra eles fazerem a ficha?"
Fácil: o mesmo que você fazia em mesas
presenciais, sem notar. Converse com eles, faça amizade, pergunte o que eles
curtem em um jogo, marque uma data pra primeira sessão, pra todo mundo se
reunir e fazer as fichas sob a sua tutoria. Se eles estão demorando, pergunte
se eles já fizeram alguma coisa, se já têm ideia do que querem ser, se precisam
de ajuda. Ofereça o pão de queijo pros seus mico-estrelas e tente parecer
amigável.
Tome um momento pra pensar nas pessoas que
pularam os outros subtítulos, vieram direto pra esse e não entenderam porra
nenhuma sobre o mico-estrela.
Agora, sério: todos os jogadores que demoraram
pra me entregar ficha e background estavam inseguros, e não desinteressados...
eles não sabiam o que fazer. Se você marcar uma data pro primeiro jogo você vai
acabar descobrindo isso — vai aparecer um bando de jogador na véspera desse dia
te confessando que não sabe o que fazer —, mas se você não marcar uma data pra
primeira mesa existe uma grande chance de que eles só fiquem quietos e tímidos
onde estão, por tempo indefinido, provavelmente pra sempre.
"Eu ainda acho que isso é falta de interesse, eu já montei a história toda e não vou ficar sendo babá de jogador."
Não é falta de interesse, mas claro, se você não
quer lidar com a insegurança de outras pessoas, e quer gente mais proativa pra
sua mesa, você não está errado. O que você precisa fazer é chamar pessoas que
já são suas amigas pra jogar, dar preferência pra pessoas mais velhas, dar
preferência pra gente que mestra e pra gente que já conhece o sistema.
Agora... se você quer catar desconhecidos na
internet, fazer novos amigos e ensinar o sistema pra novas pessoas, você vai
ter que lidar com essa insegurança. Ela vai passar quando esses jogadores
começarem a te conhecer melhor, e é provável que no segundo personagem que eles
criem pra jogar em mesa sua eles já estejam mais soltos; até lá, você vai ter
que ser paciente.
Para jogadores
Seguinte... sejam proativos. A maior parte dos
mestres não morde se vocês pedirem ajuda pra criar ficha ou background, e os
que mordem normalmente vão anunciar vaga de mesa deixando claro que não querem
iniciantes.
Por outro lado, não criem tudo sozinhos pra só
no fim mostrar pro mestre, sendo que não conhecem ele ainda: isso é receita pra
ter que fazer tudo outra vez. Decidam o que vocês vão fazer de personagem,
decidam mais ou menos o que querem da ficha, decidam a base do background e
então apresentem essa base pro mestre, e esperem ele dar o "ok" dele
antes de desenvolverem qualquer coisa mais a fundo; isso evita trabalho e
constrangimento dos dois lados.
E, por fim, não desapareçam esperando que o
mestre marque um dia ou exija o seu personagem. Muitos mestres vão interpretar
isso como desinteresse e vocês vão perder a mesa.
Resuminho pros Preguiçosos
Mestres: "não entregar a ficha" não é
sinal de que os jogadores estão desinteressados, é sinal de que eles ainda não
estão confortáveis com o mestre e, normalmente, significa que o mestre não
marcou um dia pra começar o jogo. Isso de "esperar todo mundo fazer a
ficha pra começar" é uma estratégia ruim, marque sempre um dia pra
primeira sessão, use ela pra ajudar os jogadores a fazerem ficha e background
se for necessário.
Jogadores: não sumam esperando que o mestre peça
a ficha, ele vai achar que você não está interessado. Se não estiver
conseguindo fazer a ficha, por qualquer motivo, mesmo falta de criatividade,
converse com o mestre.
Conversem.
Nota Final da Autora
PELO AMOR DE DEUS parem de desmarcar jogos
por bobeira! Quanto mais vocês fazem isso, mais jogadores órfãos vêm me
perseguir pedindo mesa! POR FAVOR, EU IMPLORO, TENHAM PIEDADE, KYRIE ELEISON,
LIBERA ME, DOMINE, DE RPG DE MESA AETERNA! AAAAAAAAAAAAAAAAAAAA!
Bons jogos a todos
NOTA DO EDITOR (O Goblin Ranzinza)
Se
você cria uma mesa com cinco Jogadores e um não entrega ficha, e/ou BG jogue
com quatro jogadores e seja feliz.
Se
você começa uma mesa e ninguém entrega ficha E BG e uns dois entregam um ou
outro, ok, esse é o normal e você já descobriu que o primeiro caso era um
exemplo fictício! Então... Pressione os desgraçados a entregarem as fichas!
Não
importa se são Mestres/Narradores/Conhecedoresdaporratoda. Se eles viraram
jogadores, acabaram de sofrer da maldição da procrastinação eterna e da leve
insegurança e gigantesca preguiça típica de jogadores.
O
DM pode gastar 20 horas durante a semana para preparar a sessão. Não importa. O
jogador não leva 5 minutos para atualizar a ficha ou passar aquele item que ele
anotou as pressas a limpo e na primeira cena de perigo ele ficará tentando
saber o que o Pinklotintra faz, mesmo
sem saber onde ou em que circunstâncias ele conseguiu aquilo e se você, DM, não
sabe, a culpa é sua de ser desorganizado! (na visão preguiçosa dele!)
Então,
seja o caso de um jogador preguiçoso, procrastinador ou tímido, todos eles
precisam daquele empurrãozinho básico chamado PRESSÃO DO CARALHO!
Tenha
um grupo no app de prefere pro grupo (Whatsapp, Telegram, sei lá) e mande no
grupo mensagens mostrando que você está mexendo com a sessão e deixando claro
que você
SABE que eles não estão fazendo nada.
Marque os jogadores nos comentários com suas @ porque eles desativarão as
notificações! Todo jogador é caótico e maligno até que se prove o contrário!
Jogadores
precisam de Incentivo, Disciplina, Cobrança e Vigilância constante. Trate-os
como crianças do Jardim de Infância cheias de açúcar na corrente sanguínea e
sem ter recebido qualquer educação em casa, de qualquer tipo.
Assim
você poderá até se surpreender e ter crise de choro quando descobrir que alguém
em uma mesa aleatória sua anota alguma coisa das sessões.
E
tenho dito.
FINALIZANDO
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